quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Do(i)s amores que se vão

O bom filho à casa torna. “Esse poderia ser seu slogan” falei ao compadre Rodrigo. Sim, quer slogan melhor para um bar? Ali, onde volto toda vez que se vai a paixão e um amor. Não só eu, mas também meus companheiros que se fazem presentes quase todos na mesma situação. Em busca do gole da salvação, do prazer do ultimo beijo que o álcool ajuda a conservar por um tempo, atrás de um trago que relembre o fogo da paixão que apagou. Cheguei tarde da noite, ali onde de tantos me despedi, era mais um dia infeliz. Não tinha mais nenhum desolado, só o próprio Rodrigo que abre todos os dias, já que todos os dias os amores se vão e aí a freguesia é garantida. “Boa noite compadre, traga aquela gelada e uma dose daquela cana!”; “Já ta na mão. Fazia tempo que não lhe via por aqui, andavas feliz demais, não é? E hoje chegou com vontade, pelo jeito a noite é longa” “É sim meu caro amigo, e como todo bom sonhador, hoje, acordei de mais um sonho. Uma vida seria pouco pra sofrer o que tenho aqui comigo”. Copo cheio, cerveja "véu de noiva", que lembrava a que tinha partido, aquele primeiro copo que desce como se fosse o ultimo prazer da vida. Em seguida a dose da cana, pra rasgar e lembrar o sofrimento que afligia a alma, mesmo que de tanto tomar e natural parecesse ela servia pra lembrar a alma, porque o corpo já calejado não refletia mais seu efeito instantâneo. Enche o copo de novo "traga outra dose, aliás, a garrafa pode ficar na mesa"; "É pra já". Ali naquele lugar onde todos os desiludidos desaguavam, naquela noite de lua cheia só eu me encontrava, lua que iluminou tanto tempo de amor e que hoje é a lanterna da minha solidão naquele fim de estrada. Noite fria e a cachaça não conseguia aquecê-la. “Mas conte aí meu amigo, qual causo dessa vez?” “Dessa vez eu aproveitei tudo compadre. Todos os minutos que foram vividos e que são indescritíveis. E isso é que me afundou mais ainda, porque vivendo tanto não queria morrer tão cedo. É uma verdade, descobri. Quanto mais se vive menos se quer morrer!” Outro gole na cerveja, outra dose desce. “Ah meu amigo! Nessa vida não se morre por amor, mas sem ele não se vive também.” Outro gole na cerveja. “É companheiro, tu hoje ta nos teus piores dias”. "Sim, Rodrigo, nos piores porque os melhores acabaram de passar", outra dose se vai. E é isso, poderia ter virado noites a fio filosofando ou chorando, quem sabe?! De tão mal nem o repertório tão aconchegante do bar que nunca mudara e era perfeito pras situações que ali se viviam eu escutara. Perder um amor tão aproveitado e um que acabara de nascer por um ser que nem nascido havia, não dava para imaginar o quão profundo poço pode ser. Depois de uma garrafa de cana e algumas cervejas, meio embriagado sabia que um pouco mais de vida eu conseguira e assim atravessei a rua para chegar à parada de ônibus, porque em casa não poderia. Não lembro muito mais e tentar detalhar é impossível. De repente acordo num calor que o inferno invejaria. Levantei do banco em que dormia, passei a catraca, bom dia cobrador, exalava aquele cheiro tão conhecido do álcool saindo do meu corpo. Todos me olharam, me julgaram e ninguém ali poderia entender o quanto eu sofria e ainda assim julgavam. Dei o sinal para descer e incomodar menos os que me rodeavam, esbarrei em algumas pessoas porque o corpo não respondia completamente às ordens. Desci, “obrigado motorista”. Sentei na calçada sem acreditar no que vivia. Chorei.

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